sexta-feira, 13 de junho de 2008

Formaturas suspeitas

UnB
Formaturas suspeitas

Reitor extingue taxa de colação de grau e manda abrir sindicância para apurar possíveis irregularidades na aplicação do dinheiro. Há indícios de que parentes de servidores teriam se beneficiado do desvio de recursos

Samanta Sallum e Renato Alves
Da equipe do Correio

Igo Estrela/Especial para o CB/D.A Press - 17/5/08
O reitor Roberto Aguiar extinguiu a taxa de formatura, considerada discriminatória: quem não pagasse não participava da cerimônia
A Universidade de Brasília (UnB) abriu sindicância para apurar o destino do dinheiro arrecadado com a taxa de formatura, criada em 1999. A justificativa da cobrança era custear a cerimônia de colação de grau dos alunos. Documentos encontrados nos computadores da Coordenação de Cerimonial apontam irregularidades no gasto desses recursos. A instituição de ensino superior teria terceirizado o serviço indevidamente.

Entre as suspeitas que vão ser apuradas está a de que parentes de servidores teriam se beneficiado de pagamentos. A investigação interna começou baseada em memorandos que mandavam pagar R$ 64 mil a prestadores de serviços pela colação dos formandos do primeiro semestre de 2007. Outros R$ 143 mil foram destinados ao pagamento do aluguel de equipamentos e decoração da mesma cerimônia.

“Numa análise preliminar, encontramos fortes indícios de ilegalidade que precisam ser investigados pela Comissão de Sindicância. Caso sejam confirmados, deve ser aberto processo disciplinar contra os servidores envolvidos”, explica o procurador da UnB, Mauro César Santiago Chaves. “É obrigação da universidade oferecer a colação de grau. Seria como eu cobrar para fazer um trabalho pelo qual já sou pago e tenho obrigação”, comentou o procurador. Se a UnB optasse por terceirizar o serviço, deveria fazer licitação, segundo Chaves.

O reitor temporário da UnB, Roberto Aguiar, mandou extinguir a taxa de formatura. Agora, a própria universidade vai custear a cerimônia. Segundo assessores do reitor, o pagamento da taxa não era obrigatório, mas “discriminatório”. Os alunos que não pagassem não podiam participar da cerimônia na UnB. O dinheiro era administrado pela Associação de Ex-Alunos da UnB, na qual a universidade não tem ingerência. A UnB cobrava a taxa e passava à associação, que tinha autonomia para contratar empresas terceirizadas.

Qualquer estudante de ensino superior precisa fazer os juramentos do ritual para receber o diploma de conclusão de curso, como exige o Ministério da Educação (MEC). Os estudantes que se formavam na UnB pagavam R$ 220 pela colação de grau. O valor era dividido em quatro parcelas de R$ 55. Há nove anos, os eventos ocorrem no Centro Comunitário da instituição. Antes, as comissões de formaturas dos alunos organizavam o evento fora da universidade.

Com o dinheiro da taxa cobrada pela UnB, a Coordenação de Cerimonial pagava o aluguel das cadeiras e das becas usados pelos formandos durante o evento, a montagem do palco, da iluminação e do sistema de som, e a compra dos canudos onde são colocados os diplomas dos universitários. O local tem capacidade para receber, a cada colação, 2,2 mil convidados sentados.

Segundo o presidente da Associação de Ex-Alunos da UnB, Marcelo Valle de Souza, a Coordenação de Cerimonial passou a ser responsável pela festa a pedido dos próprios alunos. “Os estudantes pagavam R$ 499 pela colação. Muitos não podiam custear o valor, mas queriam a festa”, conta. Ele diz ainda que parte do lucro da taxa de formatura era investida na construção da sede da associação, não concluída. “Nos colocamos à disposição da Reitoria para qualquer explicação”, ressalta.

Ministério Público
A cobrança de taxas para a participação na colação de grau é investigada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) desde março. Na época, o promotor Paulo Roberto Binicheski, da Promotoria de Defesa do Consumidor (Prodecon), enviou notificação à universidade para conferir as denúncias feitas por um ex-aluno da UnB. A manifestação do MPDFT motivou a abertura de sindicância interna da universidade.

No documento entregue à Prodecon, um rapaz de 31 anos questionou a forma de recolhimento da taxa. Ele se formou em artes plásticas no ano passado, mas ainda não havia pego o diploma. O denunciante se recusou a fazer parte da cerimônia e acusou a UnB de não oferecer alternativas para quem não pode (ou não quer) pagar pela festa. Ele contou que, na universidade, lhe disseram que a outorga antecipada só era concedida a universitários que já possuíssem diplomas de ensino superior.

Outra coisa deixou o universitário intrigado: o boleto de cobrança da taxa de colação de grau não é uma Guia de Recolhimento da União (GRU), usada geralmente pelas instituições públicas para o recolhimento de taxas. Os valores são recolhidos em nome da Associação de Ex-Alunos da UnB. Antes de encaminhar a representação ao MPDFT, o denunciante levantou informações sobre a cobrança das taxas na universidade, mas não obteve sucesso.

Expedição de diplomas
O MEC baixou uma portaria normativa, em dezembro de 2007, que impede a cobrança de taxas para expedição de diplomas. Os valores gastos pelas faculdades privadas com o material é considerado incluído nos serviços educacionais. A taxa só pode ser cobrada dos que desejam papel ou tinta especiais na confecção do documento. Por determinação do Conselho Nacional de Educação, as universidades federais precisam validar os diplomas emitidos pelas faculdades, por exemplo. As instituições públicas cobram taxas das escolas privadas pelo serviço. Mas os valores não podem ser repassados aos estudantes.

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