segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

A obra suspeita da Petrobras

A obra suspeita da Petrobras

A estatal deu R$ 2 milhões pelo prédio acima. A obra foi tocada pela mesma fundação que pagou R$ 1.000 pela lixeira do reitor

Murilo Ramos

Anderson Schneider

NA MIRA
O moderno laboratório de geologia em Brasília, erguido em 2005 com recursos públicos, mas sem licitação

Quando o barril do petróleo superava US$ 100, a Petrobras vivia momentos de exuberância. Embalada por descobertas no pré-sal, a empresa virou destaque do Programa de Aceleração do Crescimento. Com a crise, o cenário mudou. O barril está abaixo de US$ 50, e o governo, em tempo de escassez de crédito, autorizou a Petrobras a recorrer a bancos públicos para honrar despesas de curto prazo. No início, isso suscitou dúvidas até sobre sua saúde financeira. Agora, a crise começa a caminhar para a esfera política. Parlamentares da oposição resolveram mirar num conjunto de 7.438 convênios fechados com ONGs, fundações de pesquisa e sindicatos. Nesse caldeirão de contratos, chama a atenção um caso envolvendo a Finatec, fundação da Universidade de Brasília (UnB), com quem a Petrobras fechou um convênio que incluía quase R$ 2 milhões para a construção de um laboratório de pesquisa em 2005.

A Finatec ganhou fama meses atrás por comprar uma lixeira de quase R$ 1.000 para o ex-reitor da UnB Timothy Mulholland. No convênio com a Petrobras, cabia à Finatec erguer um prédio para pesquisa geológica. A Petrobras não exigiu da Finatec a realização de licitação ou concorrência. A fundação adotou, então, uma solução caseira: contratou a empreiteira Marca, ligada a um ex-conselheiro da própria Finatec. “A Petrobras pagou, no mínimo, 10% a mais e permitiu uma modalidade de gastos nada transparente”, diz Ricardo Souza, promotor do Ministério Público do Distrito Federal. “Além disso, houve atrasos na obra.”

Em resposta às perguntas de ÉPOCA, um representante da Petrobras enviou um e-mail afirmando que a Finatec “dispõe de suas próprias políticas de contratação e compras”. Ele diz ainda que a escolha da fundação para administrar a obra foi feita pela UnB. E conclui dizendo que “cabe à Universidade a fiscalização da aplicação de recursos”.

A empresa diz que a escolha da fundação foi feita pela UnB, a quem caberia a fiscalização

As explicações não convenceram o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), um dos principais opositores do governo no Congresso. “A Petrobras esconde informações. Mas sabemos que, em um ano, gastou quase R$ 1 bilhão com fundações, ONGs e patrocínios”, diz ele. Um banco de dados da Petrobras mostra que a relação dos convênios celebrados pela estatal entre 2001 e 2006 saltou de 257 para 2.601.

Nesse grupo, há outro caso problemático que já veio a público. É um convênio de quase R$ 4 milhões com o Instituto de Formação de Assessoria Sindical (entidade fundada nos anos 80 por Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT), com o objetivo de treinar agricultores para o cultivo de mamona. A prestação de contas da entidade é questionada por um procurador. A doação de R$ 1,2 milhão pela Quattor para a campanha do petista Luiz Marinho, prefeito eleito de São Bernardo do Campo, em São Paulo , também levanta suspeita. A Petrobras é dona de 40% do capital da empresa. Questionada sobre o tema, a Quattor diz que “as doações políticas foram feitas de acordo com a legislação vigente”.

Na avaliação do diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura, Adriano Pires, houve um relaxamento da direção da Petrobras. “Com o preço do petróleo nas alturas, a Petrobras diminuiu o rigor no repasse de recursos”, diz ele. A crise econômica poderá expor outros problemas da empresa, além de eventuais dificuldades de financiamento.

http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI19381-15223,00-A+OBRA+SUSPEITA+DA+PETROBRAS.html